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Cavalgada à Pedra do Reino

Em pleno período da escravatura, a promessa de os feios ressuscitarem bonitos, os pobres ricos e os negros brancos, atraiu uma legião de seguidores que achavam que, através do sacrifício humano, poderiam trazer de volta à vida o rei Sebastião de Portugal.

Agrupados no movimento conhecido como Sebastianista, parte deles se estabeleceu em São José do Belmonte (PE) entre os anos de 1836 e 1838. Junte-se a isso chás alucinógenos e histórias de traição e aí estão os ingredientes de uma história que não fica nada a dever aos filmes ou livros mais criativos e assustadores.

O domingo começa cedo, antes mesmo do sol aparecer, quando os fogos de artifício são acionados e os primeiros cavaleiros começam a surgir na praça, em frente à igreja Matriz. Logo depois vem o padre, os cantadores e o aboiador. Com a música instalada e o dia nascendo, o público vai aparecendo aos poucos, até que uma grande multidão presencia a benção do padre aos cavaleiros, que então partem na famosa Cavalgada à Pedra do Reino, um percurso de cerca de 28km pelo meio do mato.

A cavalgada é seguida por centenas de cavaleiros, e é bastante exaustiva, com mais de cinco horas de duração. O sol é forte, a poeira intensa, as roupas pesadas (especialmente a dos figurantes, incluindo rei e rainha) e a trilha não é fácil. Para amenizar um pouco, a trilha conta com dois pontos de apoio. No primeiro é servido um café da manhã e no segundo, já próximo do Sítio Histórico da Pedra do Reino, os participantes se recuperam para a chegada triunfal.

O percurso pode ser seguido de carro, porém é necessário muita disposição para enfrentar as dificuldades e adversidades da longa trilha. Um veículo com tração nas quatro rodas ou uma pick-up seriam o ideal para este trajeto. Quem deseja estar presente apenas para a chegada da comitiva e para a festa que acontece no sítio histórico pode seguir por uma estrada alternativa de asfalto, um pouco mais longa, mas mesmo assim ainda vai ter que enfrentar um curto trecho de terra (em condições muito melhores do que a trilha) para chegar lá.

O encontro com o público se dá no Sítio Histórico da Pedra do Reino, no alto da Serra do Catolé, próximo da divisa com a Paraíba, onde uma multidão aguarda a chegada dos cavaleiros uniformizados. Recebidos com grande festa, eles participam de uma pequena cerimônia no local, em frente à Pedra do Reino, e, exaustos, se confraternizam com o público e posam para fotografias com os visitantes. Depois, a diversão fica por conta das barracas de comidas e bebidas, e se estende pela noite adentro, com shows de artistas que se apresentam num palco montado no lugar.

A Cavalgada à Pedra do Reino é promovida pela Associação Cultural Pedra do Reino e acontece todos anos, sempre no último final de semana de maio. A festa, no entanto, contempla outras atrações e não apenas a cavalgada propriamente dita. No sábado anterior acontece a Cavalhada Zeca Miron (na parte da tarde, no estádio municipal O Carvalhão) e também a apresentação de violeiros, sanfoneiros, banda de pífanos, reisado, bacamarteiros e muito mais (na parte da manhã, na praça Sá de Moraes).

O evento mostra um Brasil genuíno, mesclado com elementos medievais incorporados pelo eterno Suassuna. O percurso, que se inicia em 1836, com um grande massacre de vidas humanas, prossegue com uma ficção inspirada nesse episódio e termina com uma celebração anual que reproduz passagens da literatura. Da vida à arte à vida. Fica a lição de que as interações são mútuas, complexas e, geralmente, surpreendentes.

Para conhecer mais sobre a festa e a sua história, recomenda-se a leitura dos livros “Cavalgada à Pedra do Reino” e “Pedra do Reino – a tragédia que virou festa”, ambos de autoria de Ernando Alves de Carvalho, médico, escritor e historiador, natural de São José do Belmonte (PE) e que fez extensas pesquisas acerca do assunto, garantindo a preservação desta magnífica história para as gerações futuras.

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